sexta-feira, abril 22, 2011

A moral cega-nos

Este último livro (“Economia, Moral e Política”) de Vítor Bento é um pouco indigente. O autor desculpa-se logo ao início dizendo que não teve muito tempo para o escrever. O último capítulo, aliás, constitui um outro texto que escreveu e que aparece aqui reciclado.

O livro não é tanto uma relação entre a economia, a moral e a política. É muito mais a descrição de como a moral do autor influencia a sua leitura económica e o seu posicionamento político. Apresentam-se dois ou três exemplos.

Os credores estão sempre de boa fé e, quando se verifica um incumprimento, são sempre vítimas dos devedores. Afirma mesmo que existe assimetria de informação entre credores e devedores, a favor dos segundos (estão sempre em melhores condições de avaliar o risco). Hoje as coisas são muito mais complexas. Muitos de nós somos credores e devedores ao mesmo tempo. O sistema financeiro é que regula esses diferentes estados. É que também ele é credor e devedor em simultâneo. Como se verifica com muitos produtos derivados, qualquer um de nós pode estar a endividar-se a uma instituição financeira e ao mesmo tempo a comprar a sua dívida que essa mesma instituição ou outra lhe oferece devidamente titularizada e empacotada com outra.

A crise financeira resulta, para o autor, de vários factores: de uma bolha especulativa, de desequilíbrios macroeconómicos à escala global (excesso de poupança na China e excesso de consumo nos Estados Unidos), de um sector financeiro desregulado, de gestores, incentivados por prémios absurdos, mais preocupados com objectivos de muito curto prazo das empresas e não com a sua sustentabilidade. Afirma também que os Estados para evitarem o colapso da economia mundial tiveram que compensar o ajustamento nos balanços dos privados com mais investimento público e mais injecção de liquidez pelos respectivos Bancos Centrais. Depois disto tudo, conclui que a manutenção do estado social, sobretudo na sua versão europeia, é insustentável. Percebem a relação? Enfim, percebe-se que, para o autor, qualquer que seja o diagnóstico a conclusão é sempre a mesma. Mesmo que a relação entre o diagnóstico e a conclusão seja a mesma que existe entre o toucinho e a velocidade. O que estamos a assistir é a uma profunda redistribuição a favor de quem provocou esta crise e é o estado social que, não a tendo provocado, a está a pagar. Onde é que está a moralidade disto é que não sei.

A última é uma autêntica pérola. O mercado tem o encargo de produzir riqueza para que o Estado possa consumir dela uma parcela. Pelos vistos, o Estado não produz riqueza, o que é no mínimo estranho. Ficamos a saber que uma operação num hospital público não se consubstancia na produção de riqueza enquanto se essa operação se realizar num hospital privado já se produz essa riqueza. Também estava convencido que quem produzia riqueza eram as empresas, as famílias e os Estados. Pelos vistos são os mercados que fazem camisolas, bonés e computadores.

Enfim, os meus valores são diferentes dos do autor e, por isso, olhamos de maneira a economia e a política. Não sei se são melhores, mas que são diferentes, lá isso são.

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