segunda-feira, dezembro 31, 2007

Será que existe mercado em Portugal?

O caso "BCP" levanta, a meu ver, a justa interrogação que faz o título deste "post". Primeiro, parece que as Direcções podem transitar, sem mais, de bancos para bancos. Sendo instituições concorrencias, parece que não existe qualquer inconveniente em um concorrente ficar, por esta via, com informação sigilosa e preferencial de outro. Segundo, pelos vistos é norma haver participações cruzadas. Aparentemente, para melhorar as contas de um dado exercício, o BCP vendeu acções de uma empresa que participa no seu próprio capital. Mais, esta empresa foi um dos principais actores desta lista que transita da Caixa. Terceiro, o BCP parece que empresta dinheira a outros para comprarem as suas acções. Manipula, assim, o mercado da forma que quer. Quarto, as entidades reguladoras (CMVM e Banco de Portugal)parece que não regulam nada, a não ser que alguém apresente uma queixa na procuradoria. Quinto, essa mesmas entidades, agem sem qualquer transparência e escrutínio púlico. O Presidente do Banco de Portugal promove uma reunião com os administradores do BCP e, ao que se sabe, os seus nomes são vetados por essa instituição. Não existe um processo e uma decisão formal sobre o assunto, tudo se passa no segredo das reuniões. Sexto, o Governo acaba por ter um papel decisivo na resolução da crise. Por fim, o maior partido da oposição reclama para si a Presidência da Caixa.

Alguém quer que acreditemos que existe mercado em Portugal?

terça-feira, dezembro 11, 2007

O Tratado de Lisboa

Começo a ver o "Prós e Contras e, depois, não resisto. A questão do referendo não pode continuar a ser uma arma de arremesso político, sobretudo, de muitos partidos da esquerda e de outros de direita. Mais, esta questão do referendo serve, essencialmente, para manter uma posição dúbia, por mera estratégia política de curto prazo, quanto à sua opinião em relação à integração europeia.

A meu ver, isto só tem uma solução. É efectuar um referendo em que a pergunta seria qualquer coisa como: "Considera que Portugal deve pertencer à União Europeia?". Esta é a pergunta, definitivamente, clarificadora.

Não podemos estar sempre a votar de forma esmagadora em partidos que têm programas políticos, claramente, a favor da integração europeia e, depois, a termos dúvidas quando eles se limitam, na prática, a aplicar esses programas políticos.

Por isso, vamos por partes. Primeiro é preciso saber, definitivamente, quem é ou não favorável à integração europeia. Depois, se prevalecer o sim, como espero, temos que respeitar a democracia representativa. Não a podemos estar sempre a por em causa a propósito da nossa participação na União Europeia.

É que, no limite, o que estamnos a fazer é a corroer os princípios em que assenta a nossa democracia representativa. É que não me parece possível outro modelo de democracia. Mais do que a questão da integração europeia, isto é o que me preocupa.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Só é idoso quem pode

Este Governo (e bem, do meu ponto de vista) reviu a idade e o valor das reformas. Procurou aproximar o Regime da Função Pública ao Regime Geral e, por outro lado, ajustar essa idade de reforma e período contributivo à esperança de vida. A esperança de vida tem, felizmente, aumentado e não faz qualquer sentido, de facto, continuar a estabelecer idades para aposentação sem ter isso em devida consideração. Até aqui, tudo bem.

O problema é que podemos começar a levar este raciocínio, mesmo, até ao fim. Como a questão é vista somente pela óptica do financiamento da Segurança Social, alguns já o começaram a fazer. Por que não ajustar a idade da reforma à esperança média de vida? Ou só permitir que alguém se reforme quando não disponha de condições de saúde para continuar a trabalhar? (Existe sempre a possibilidade de se nomear uma comissão para se avaliar cada caso; aliás, conhecemos bem, pelo passado recente, o resultado do funcionamento desse tipo de comissões).

Como se vê, esta discussão é infindável. Sabe-se como começa mas não se sabe como acaba. O estabelecimento de uma idade razoável para a reforma, cuja discussão importa fazer, é, em minha opinião, uma conquista civilizacional. Quando a colocamos em causa, colocamos em causa, ao mesmo tempo, uma certa forma de ver o mundo e a humanidade.

É que podemos chegar ao limite de a reforma ser só para alguns. Mais uma vez, para aqueles que a poderem pagar. Aí, não tenhamos dúvidas, retrocederemos do ponto de vista civilizacional.

terça-feira, novembro 20, 2007

O Cheque-Ensino

Há ideias que vendem. A ideia do cheque-ensino é uma destas. Do meu ponto de vista, é uma ideia inexequível, mas vende bem nos jornais e nos media em geral.

Primeiro ponto, nunca ninguém se deu ao trabalho de explicar qual deveria ser o valor desse cheque. Deveria ser: igual para todos? Maior para as famílias com menores níveis de rendimento? Maior para as famílias com maiores níveis contributivos? Maior para as famílias com mais filhos?

Independentemente, da forma como deveria ser distribuído o "bolo" que financiaria os cheques-ensino, outra questão tem que ver com o montante do "bolo" e, consequentemente, sobre o valor absoluto dos cheques. O cheque deve ser num montante que permita a qualquer cidadão deste país inscrever os seu filhos no melhor colégio do país? Se assim não for, não se está, simplemente, a co-financiar a educação dos mais ricos que, com cheques mais ou menos gordos, terão sempre condições para colocar os seus filhos nos melhores e mais caros colégios do país?

Depois, sobra a questão da existência de uma efectiva liberdade de escolha por parte de todos os cidadãos. Mesmo admitindo que o cheque seja suficientemente gordo para que qualquer cidadão possa colocar o seu filho no melhor colégio do país, a questão é se, mesmo assim, esse seu filho poderá aceder a esse colégio. O colégio não se reservará o direito de escolher os alunos? A escolha das escolas não estará sempre condicionada pela proximidade geográfica? Essas escolhas não serão sempre determinadas, também, por motivações de ordem cultural, social, etc?

O cheque-ensino é, como se vê, uma mistificação. Voltamos ao primeiro parágrafo: porque é que esta ideia vende tão bem? Porque ela, no fundo, serve razões ideológicas. O que se está a dizer é que o Estado deve deixar de ter esta função redistributiva e de promoção da igualdade de oportunidades (dizer mal do Estado e procurar reduzir as suas funções vende bem). Se levarmos esta raciocínio do cheque-ensino até ao fim, o que se está a dizer é que só deve ter os filhos na escola quem o puder pagar. No fim, está um raciocínio, ainda, mais preverso: só devem ter filhos aqueles que os podem pagar.

domingo, novembro 18, 2007

Cheque-ensino, aposentações, natalidade e saúde

Pode parecer que não mas estas temas, da forma como são tratados todos os dias pelos media, mantém uma relação muito estreita entre si. O que hoje está verdadeiramente em causa não é o cheque-ensino/escola pública, os PPR/Segurança Social, os seguros de saúde/SNS ou o abono de família/direito a ter flhos. O que está em causa, para alguns, é se o Estado deve (man)ter alguma função redistributiva. Para muitos não deve (man)ter. O resto são pretextos.

Analisaremos, um dia destes, cada um destes temas isoladamente.

O modelo de financiamento do novo aeroporto: o barato (para o Estado) no curto prazo sai, quase sempre, caro

O modelo de financiamento do novo areoporto está, pelos vistos, mais ou menos equacionado. O investimento será suportado por uma parceria público-privada e o "project finance", ao que se sabe, prevê a concessão aos privados do monopólio sobre a gestão do espaço aéreo português e dos aeroportos.

Isto é, vamos substituir um monopólio público por uma monopólio privado. Como já disse sobre isto o Prof. Daniel Bessa, pior que um monopólio público só um monopólio privado.

Lá vamos ter os utentes e os cidadãos a pagar tudo isto. Engane-se quem pensa que isto é um negócio equilibrado e que os riscos serão igualmente distribuídos entre o Estado e os privados. Os privados já têm do lado deles a garantia da receita para o que vão investir, fora aquilo que ainda hão-de conseguir do Estado...

Perante tudo isto, o melhor é mesmo discutirmos, todos, a localização do novo aeroporto. Este é o tipo de discussão futebolística que tanto apreciamos.

O novo aeroporto e a TAP

Nesta discussão sobre o novo aeroporto deve-se seguir, a meu ver, o método do Poirot: deve-se procurar quem é que ganha com a sua construção. Para além dos interesses do "betão" do costume, este aeroporto serve, sobretudo, à TAP. A TAP precisa de concentrar as suas operações e a Portela já não serve como "hub". Quanto às outras companhias, como é natural, aterrarão onde puderem (Porto, Faro, Portela, etc)e onde lhes disserem para aterrar (ninguém, seriamente, acredita que nos venhamos a constituir como uma "placa giratória intercontinental").

Em si mesma, parce-me uma boa razão. A TAP precisa, logo faça-se. A questão que, um tipo chato como eu, se pode colocar é a seguinte: os interesses da TAP correpondem ao interesses da população em geral? Eu tenho dúvidas. Se o objectivo, como se espera, é o de vir a privatizar a TAP, o que se pretende, mais uma vez, é com recurso aos contribuintes do costume, criar um negócio mais ou menos interessante para uma série de investidores privados.

Falta, ainda, um ponto da discussão que tem que ver com o modelo de financiamento do novo aeroporto. Lá iremos.

OTA, Alcochete ou o meu quintal

A questão do novo aeroporto anda muito mal explicada. Como é óbvio, para um dado aeroporto várias localizações são viáveis. Cada uma terá as suas vantagens e inconvenientes face às restantes. Isto é, a localização seleccionada deverá ser aquela que obtenha a melhor combinação entre vantagens e inconvenientes (não acredito que nenhuma localização tenha todas as vantagens em relação a todas as outras alternativas). Os técnicos podem substituir os políticos quando chegar a altura de efectuar essa ponderação? Do meu ponto de vista, não.

Nesta altura, para que é que, então, servem os técnicos? Para explicitarem as vantagens e inconveninetes de cada localização de forma a que os políticos possam efectuar essa ponderação.

Então porque é que se anda nesta discussão? Porque o Cavaco não aceita a localização da OTA. E isso é uma posição política legítima. Só que a quer fazer passar como uma opção, estritamente, técnica. O resto são os interesse, legítimos e ilegítmos, e o foguetório do costume.

Eu preferia a discutir para que é que serve o novo aeroporto. Mas, pelos vistos, já toda a gente sabe para que é que ele serve. Só que eu ainda não percebi. Voltarei a esta discussão.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Não sei se há várias maneiras de se ser Robin dos Bosques ou se, hoje, é mesmo possível sê-lo

Teodora Cardoso, diz-nos, hoje, no Jornal de Negócios, que “[…] Portugal [é] um dos países da União Europeia com um dos níveis mais altos de pobreza e desigualdade social, em simultâneo com despesas sociais acima da média e em crescimento rápido. Esta é a consequência da ênfase colocada ao longo dos anos nos inputs em detrimento dos resultados e da tendência para centrar as atenções na distribuição primária do rendimento (em especial, na remuneração do trabalho) e não na sua correcção por via orçamental”.

De facto, não há nada como um conjunto de argumentos bem estruturado para podermos ter uma discussão clarificadora. Com efeito, não posso deixar de estar mais de acordo com a primeira causa. Este é, aliás, um problema que não tem que ver só com as políticas sociais. Em boa verdade, a nossa principal política, ao longo de muitos anos, sempre foi a de "por dinheiro sobre os problemas". Se as políticas sociais, como muitas outras, fossem sistematicamente monitorizadas e avaliadas tinham produzido outros resultados. Mas para isso, era necessário que essas políticas tivessem resultados a atingir definidos à partida…

Quanto à segunda causa, eu penso que a “coisa” é mais complicada. Existe (ou existiu, mesmo) margem de manobra orçamental para se corrigirem alguns dos problemas mais graves em termos sociais em Portugal? Até quando ou, melhor, até que montante as pessoas estão dispostas a ser solidárias? Com a limitação progressiva das funções sociais do Estado e os cortes, necessariamente, discriminatórios (embora, justificáveis) em quem recebe os seus benefícios (para que se faça a, necessária, redistribuição) não se gera, a prazo, uma situação insustentável em democracia?

Tenho receio que as respostas não sejam muito a nosso contento. Mas também é verdade que, provavelmente, ainda há mais limites para se chegar lá, como nos diz Teodora Cardoso, pela distribuição primária do rendimento.