quinta-feira, junho 25, 2009

A fuga às nossas responsabilidades

A receita para quase tudo é privatizar. Privatizamos as escolas, privatizamos o Serviço Nacional de Saúde, privatizamos o abastecimento de águas e os rios, enfim, privatizamos tudo. Privatizar é um forma de preguiça mental, por um lado, e de desresponsabilização quanto ao nosso futuro colectivo, por outro.

Para quê pensarmos quando podemos privatizar e deixar os outros pensar por nós. Para quê empenharmo-nos na construção do nosso destino colectivo, se podemos acreditar que ele se constrói pelo somatório dos nossos destinos individuais.

Eu ainda sou dos que acredita que podemos, todos, pensar o nosso futuro colectivo e, contribuindo cada um com a sua parte, fazermos em conjunto com que ele seja possível.

segunda-feira, junho 15, 2009

Reflexões ao acaso sobre o nosso sistema de ensino

Não é comprável o sistema de ensino de hoje com o de há 30-40 anos atrás. Como vivi os dois, primeiro, como aluno e, depois, como professor do ensino superior, sinto algum à vontade para falar sobre isso. Os objectivos são diferentes, a sociedade também, etc, etc, etc. Agora uma coisa a minha experiência me permite afirmar: os melhores de hoje são muito melhores do que os melhores de ontem. Também é verdade que uns e outros são melhores em coisas diferentes. Mas o balanço é mais favorável aos de hoje.

Por outro lado, os piores de hoje são avaliados; os piores de ontem eram excluídos (os piores eram, em regra, os mais pobres e de estratos sócio-culturais mais baixos da nossa anquilosada sociedade portuguesa de então). Parecem coisas idênticas mas não são. Assim, o nível de exigência do modelo ensino actual (e os sistemas de classificação dos exames) tem em vista, hoje, avaliar todos ao alunos e não, simplesmente, seleccionar aqueles que podem prosseguir os seus estudos (no meu tempo, muito antigo, “entravam” para o ensino superior por anos cerca de 15.000 alunos). Enfim, os exames servem para aferir do mérito absoluto mas também para medir o mérito relativo (no tal tempo que vivi, um aluno excepcional raramente tinha uma classificação superior a 16; hoje a classificação vai mesmo dos 0 aos 20 valores).

Apesar de tudo, o sistema actual merece-me dois reparos: um relativamente ao português e outro à matemática.

Só se sabe o que se é capaz de formalizar. Saber escrever na língua materna é, por isso, fundamental. É porque é no contexto dessa língua que se aprende (por essa razão é que não se pode confundir a importância da língua materna relativamente à de uma segunda língua). Saber escrever passa, primeiro, por saber ortografia. A ortografia não passou a ser uma questão menor. É que as questões formais da língua não são, na sua totalidade, susceptíveis de correcção pelos computadores.

Passemos à matemática. A tabuada é fundamental. Esse exercício de memorização, a meu ver, é determinante para, no mínimo, se treinar a nossa memória instantânea. Este tipo de memória é que permite, por exemplo, que quando estamos a resolver um problema complexo possamos estar, simultaneamente, a formalizar, por escrito, uma dada fase dessa resolução e a pensar três ou quatro passos à frente dela. O pensamento abstracto, que tanto necessitamos, requer essa capacidade de memorização (já não nos lembramos que começou por ser um exercício de memorização, mas assim foi). Efectuar, portanto, contas de multiplicar e dividir com diversas casas décimas é só uma forma mais avançada de se manter viva a tabuada e de se treinar o cálculo mental.

Por fim, uma nota sobre o ensino superior. Os alunos licenciados pelas nossas melhores universidades sempre foram (e continuam a ser) competitivos no mercado internacional. O problema é, mais uma vez, o de se comparar o que não é comparável. Como disse, nos meus velhos tempos, “entravam” para o ensino superior 15.000 alunos. Hoje “entram” centenas de milhar. Infelizmente, o nosso mercado só muito recentemente é que começou a fazer distinções. É que nem todas as universidades são iguais. Outra coisa é o que se chama “Processo de Bolonha”. Como não se conhecia bem o problema (sobretudo o das más universidades) arranjou-se uma solução para o problema que não tínhamos (ou, pelo menos, que não tinham as boas universidades).