domingo, outubro 04, 2009

Classe média: a utopia de Krugman?

Acabei de ler a “A Consciência de um Liberal” de Paul Krugman. O livro é muito interessante a vários níveis.

Começa por dizer que a desigualdade social, que se acentuou nos Estados Unidos após os anos 80, não resulta de qualquer determinismo económico. O discurso sobre as desigualdades como consequência da globalização é, deste modo, considerado um mero exercício de retórica e que serve fins políticos. A desigualdade decorre de decisões políticas e de decisões políticas assentes numa determinada ideologia (o neoconservadorismo ou o conservadorismo de movimento, como o designa o autor).

Essa ideologia, protagonizada por Reagan, Gringrich, Busch e outros, resulta de uma viragem do Partido Republicano que passou a ser liderado por uma determinada facção com uma agenda muito própria, assente, no essencial, no desmantelamento das instituições resultantes do New Deal de Roosevelt. Para se impor uma determinada ideologia, nos Estado Unidos e em qualquer país democrático, é preciso que se organize num partido e, depois, ganhe eleições. Para isso, essa agenda (escondida) precisava de obter um conjunto de consensos, nem que fosse pela negativa. Por exemplo, percebemos que, implicitamente, o racismo esteve sempre presente nas decisões dos eleitores, bem como, a convicção de que os Republicanos defendiam melhor o país que os Democratas.

Ao ler este livro recordei as minhas leituras, há muitos anos atrás, de Marx. A ideologia dominante, a partir dos anos 80 nos EUA, foi a ideologia da classe dominante e o governo e o Estado não foram mais do que instrumentos de domínio dessa classe. É mais difícil identificar essa classe dominante (são os detentores dos meios de produção mas não só); e a luta de classes não se travou com os trabalhadores mas com a classe média (que é bastante mais heterogénea), que sai a perder, tendo contribuído ela própria também para isso quando votou, muitas vezes, contra os seus interesses (talvez por lhe faltar - ou não poder ter - consciência de classe).

Esta é uma leitura muito simplista. Os EUA eram e são uma sociedade mais complexa do que aquela que resultou da primeira revolução industrial. Agora, percebemos que, nos EUA e nos restantes países ocidentais, a classe média está a desaparecer. Será que é uma fatalidade? Krugman não só não considera esse desaparecimento uma fatalidade como vai mais longe, afirmando que estão reunidas as condições políticas, económicas e sociais para um novo New Deal. E nós? Vamos ficar parados?