sábado, janeiro 23, 2010

Subitamente no Verão passado …. (Parte I)

… surgiu uma notícia em todos os jornais onde se afirmava, citando o trabalho de Maria Manuel Campos e Manuel Coutinho Pereira (“Salários e Incentivos na Administração Pública em Portugal”) do Banco de Portugal, qualquer coisa como “os salários da administração pública são cerca de 75% superiores aos dos que se praticam no sector privado, tendo o diferencial aumentado 25 pp. de 1999 a 2005”. Os trabalhos que tiram este tipo de conclusões têm sempre boa imprensa. É que, contrariamente aos restantes cidadãos, os funcionários públicos são uns malandros e uns privilegiados e é preciso denunciar isso.

Vamos por partes.

O estudo começa por afirmar que “a Administração Pública […] é a entidade empregadora de cerca de um quinto da mão-de-obra nacional”, não se explicando onde é que isto empiricamente se encontra sustentado. Aparentemente, os autores limitaram-se a dividir os funcionários identificados no Recenseamento Geral da Administração
Pública com um total, que resulta da soma destes funcionários com os trabalhadores por conta de outrem que constam dos Quadros de Pessoal. Como se sabe, um recenseamento (como o Recenseamento Geral da Administração Pública) abrange todo o universo e, portanto, identificaram-se todos os funcionários públicos. Os Quadro de Pessoal incluem só uma parte dos trabalhadores por conta de outrem (entre 50-70%) e excluem todos aqueles que trabalham por conta própria (profissionais liberais, empresários em nome individual, patrões, etc). Isto é, dão conta de uma só parte do universo.

Para se ser rigoroso, como é que essas contas devem ser feitas? Simplesmente, dividindo o número de funcionários identificados, em 2005, no Recenseamento Geral da Administração Pública (737,8 mil) pela população activa (5.544,9 mil)em 2005. Se assim fizermos, verificamos que os funcionários públicos representam 13,3% da população activa, isto é, "cerca de um oitavo". Mas, se quisermos obter dados mais negativos, podemos sempre dividir esse número de funcionários pelo número de empregados em 2005 (5.099,9 mil). Se assim fizemos, verificamos, agora, que os funcionários públicos explicam 14,5% do emprego total, isto é, "cerca de um sétimo".

Bem, quaisquer que sejam as contas, os funcionários públicos representam entre um sétimo a um oitavo do total, conforme nos referimos ao emprego ou à população activa.

Porque é que os autores falam em “cerca de um quinto”? A expressão “cerca”, num "rigoroso" trabalho académico, acaba por revelar todo um programa político. Convém deixar claro que os malandros dos funcionários públicos para além de ganharem mais do que os outros, ainda por cima, são muitos.

Quanto a esta parte, estamos conversados.

(continua)

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