quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Keynes ainda faz sentido?

Depois desta crise há um debate relativamente ao impacto que o investimento público terá na recuperação da economia, num contexto em que as economias são mais globalizadas, e por isso, mais propensas às importações. Argumenta-se que perante um aumento da procura resultante do investimento público num determinado país, os efeitos sobre o produto são escassos porque parte significativa dessa procura é satisfeita por via do aumento das importações. Por outro lado, as economias Keynesianas dos anos 50 e 60, sendo economias tipicamente fechadas, nas quais o comércio internacional era escasso, o efeito do investimento público na produção era bastante mais acentuado, pelo que se argumenta que a política pública era mais eficaz nessa época.

Este debate sendo interessante é inócuo no seguinte ponto. Actualmente deixa de fazer sentido falar-se no efeito multiplicador do investimento efectuado por um único país, sendo urgente discutir o impacto nesse país do investimento efectuado por todos os outros países, num cenário de cooperação e planeamento.

O seguinte exemplo é muito claro. Consideremos Portugal e Espanha no nosso exemplo. Se Portugal aumentar o investimento, isso gera um acréscimo na procura que é satisfeita em parte pelas importações oriundas de Espanha. Mas se Espanha aumentar também o seu investimento, isso gera um acréscimo na procura que será satisfeita por importações oriundas de Portugal. Em ambos os casos, o aumento do investimento de cooperação provoca o aumento do comércio internacional, o que origina um aumento da produção nos dois países, o que não aconteceria se fosse um único país a dar um choque positivo no investimento.

Por isso, é urgente passar da análise do efeito multiplicador isolado, para o efeito multiplicador da cooperação à escala multi-regional. Se a globalização aumenta a integração das economias, parece claro que a transmissão desses efeitos entre os países é mais significativa. Parece paradoxal mas, nas economias o que a globalização abriu, a cooperação voltará a fechar, recuperando-se em parte os efeitos keynesianos de quando as economias eram um pouco mais fechadas. Não é por acaso que actualmente se fala em cooperação ao nível internacional relativamente às políticas públicas, sendo esta temática muito abordada durante a crise que estamos a viver. Parece que estamos a voltar ao tempo do planeamento económico. Espero bem que sim.

Vasco Leite
Economista

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