Para aqueles que são fanáticos das discussões sobre avaliação do desempenho e a meritocracia na Administração Pública, aconselho a leitura da “Empresa Moderna” de Jonh Roberts (distinguido pelo “The Economist” como “Best Business Book”). Trata-se de uma obra, a todos os títulos, insuspeita. Não foi escrita por nenhum sindicalista nem por ninguém que defenda teses conservadoras sobre o mercado de trabalho e o emprego. Mais, fala sobre empresas e não sobre a Administração Pública.
Este autor, sacrilégios dos sacrilégios, vem propor que se adoptem nas empresas sistemas de incentivos aos seus colaboradores muito alinhados por princípios cuja aplicação na Administração Pública sempre defendi, como, aliás, muitas outras pessoas que conhecem muito bem (e por dentro) as missões que estão destinadas a essa mesma Administração. Jonh Roberts vem, de uma forma muito sustentada analítica e empiricamente, sublinhar aspectos que, a meu ver, são evidentes mas que, por ignorância ou má fé, estão sempre ausentes desta discussão. Em primeiro lugar, as pessoas fazem parte de uma organização e, antes de mais, é no contexto dessa organização que devem ser avaliadas e incentivadas. Uma empresa, um instituto, uma direcção geral são formas de organização tendo em vista consecução de uma dada estratégia. Dito de forma simples, um dado tipo de organização está ao serviço de um estratégia e as pessoas inserem-se na organização na exacta medida em que permitem que ela, no seu conjunto, responda a essa estratégia.
O desempenho das pessoas deve ser aferido a partir deste ponto de vista. E, aí, temos que perceber que certos incentivos que promovam a iniciativa individual e o desempenho pessoal podem gerar efeitos perversos. Por exemplo, é normal que um vendedor seja avaliado e incentivado em função das vendas que promove. Mas, por exemplo, um departamento de I&D deve ter incentivos que promovam a iniciativa individual e/ou que promovam lógicas cooperativas? Neste caso, somos levados a pensar que estimular a iniciativa individual, a partir de certos níveis e sem contraponto com incentivos que estimulem lógicas de funcionamento cooperativas, pode dar os piores resultados possíveis.
Também é muito diferente avaliar quem desempenha uma só tarefa ou quem desempenha mais do que uma tarefa. E a situação ainda se complica mais quando uma das tarefas pode ser aferida com objectividade enquanto as outras o não podem ser. Esta situação gera os incentivos mais perversos. Na dúvida, existe uma concentração nas actividades que podem ser mais facilmente quantificadas e avaliadas objectivamente, mesmo que isso seja contrário à própria estratégia que a organização persegue.
Não pretendo com este comentário substituir-me à leitura do livro. Por essa razão, gostaria de concluir com um ponto, que me parece muito interessante, explorado por John Roberts. Um dos aspectos que ele reconhece como muito importante para se conciliarem incentivos à iniciativa individual com o trabalho de equipa, e, em especial, em situações multi-tarefa (onde, ainda por cima, nem sempre é possível aferir o desempenho de forma estritamente objectiva e quantificável), é o da reputação de quem avalia. Só um elevado nível de reputação, reconhecida interna e externamente, de quem avalia é que permite, em muias circunstâncias, conciliar estas duas lógicas (iniciativa individual, por um lado, e cooperação, por outro).
As questões que esta análise suscita são muitas e “mortais” para o sistema que hoje está montando na Administração Pública. Será que estamos a recrutar para Altos Dirigentes e Dirigentes Intermédios pessoas com o nível de reputação necessário? A lógica de nomeação política dos Altos Dirigentes é a melhor forma de se assegurar essa reputação?
Sem comentários:
Enviar um comentário