terça-feira, novembro 14, 2006

Por que é que, com frequência, as decisões tardam?

Todos nós temos situações vividas (sofridas, mesmo) de processos tratados com a Administração Pública cujas decisões finais demoraram tempos intermináveis. Muitas das razões são conhecidas: falta de eficácia e eficiência da Administração, legislação confusa, nível elevado de iliteracia dos utentes, etc, etc, etc. Não me interssa, agora, falar muito deste tipo de deficiências estruturais. São iguais em todo o país e, muito provavelmente, não são um factor de distinção entre o público e o privado. Quem nunca tratou de um assunto com a TV Cabo que atire a primeira pedra.
Interessa-me mais analisar as consequências preversas dos procedimentos que os políticos lançam mão para encurtarem os prazos de resposta da Administração Pública. Normalmente, quando os prazos de resposta são longos, qual é a primeira medida que passa pela cabeça de um político? Reduzir, por via legal, esse prazo. Fica contente, fez a sua parte, e acredita que a realidade muda, como por magia, por haver um novo diploma legal. Como, depois, os resultados não são monitorizados esse político nunca chega a ficar angustiado. Será que uma medida destas não poderá provocar, exactamente, os resultados contrários ao pretendido? Em minha opinião, isso acontece com muita frequência. Os estímulos estão lá é só preciso analisá-los com pormenor.
Quando um político encurta prazos de resposta fá-lo sem qualquer sustentação empírica. Isto é, não sabe se , com base nos procedimentos que estão previstos na lei e nos recursos disponíveis, é de facto possível responder de forma mais célere. Julga, à partida, que o prazo é longo e vá de encurtá-lo. Não prevê nem reafectação de recursos para aquele tipo de tarefa nem, muito menos, alteração de procedimentos.
Se o novo prazo previsto for irrealista, o que é que um funcionário público faz? Obviamente, descobre a primeira deficiência na instrução do processo e devolve-o ao promotor para rectificação. A contagem do prazo supende-se. Enfim, ganha tempo. Este processo pode ser repetido vezes sem conta. Quando não é possível este expediente resta uma só solução: não cumprir, simplesmente, o prazo. E, aqui, como sabemos, se o prazo estabelecido for irrealista e se, de certeza, for impossível de cumprir, o "crime" é igual se o incumprimento for de um dia ou de dois meses. Nestes casos, o atraso começa a ser endémico e, apartir de certa altura, já ninguém sabe se o atraso face à lei resulta da irrazoabilidade da lei ou da ineficácia ou ineficiência do serviço.
A solução para isto é muito simples. Os prazos devem ser estabelecidos com todo o rigor e, por essa razão, devem estar muito bem suportados em fluxogramas que contemplem todos os procedimentos legalmente previstos. Quando um político decide a alteração de um prazo deverá sempre, portanto, sustentá-lo na reafectação de recursos da Administração e/ou na alteração de procedimentos. Alterar prazos por alterar, vale mais estar quieto.
É óbvio que os organismos de inpecção também dão aqui uma ajuda preciosa. Nunca ninguém leu um relatório de auditoria em que se tenha considerado que um determinado procedimento é redundante e que, por essa razão, deve ser eliminado. Pelo contrário, na dúvida, o funcionário deveria ter efectuado mais procedimentos e solicitado mais e mais papeladas aos utentes.
Existe uma outra razão de fundo, que um outro dia irei analisar, e que tem muito que ver com aqueles processos que se arrastam anos e anos pelos departamentos do Estado. Neste caso, a razão é mais funda, quer os funcionários, quer, essencialmente, os políticos não sabem ou temem dizer não. Vale a pena estudar, um dia, porque é que somos tão avessos a dizer não.

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